Dia Internacional da Mulher - Por que ainda lutamos?
13 de março de 2023
Lembro de uma experiência em sala de aula, em que estava lecionando sobre a história do movimento feminista e um aluno, de forma sincera, perguntou: “Professora, se as mulheres já podem votar, já podem trabalhar, têm os mesmos direitos civis e políticos dos homens, o que mais elas podem querer?”Nesse momento, eu parei e refleti como eu daria uma resposta que fosse convincente. Afinal, o questionamento desse aluno é reflexo de um inconsciente popular que acredita que mulheres e homens são iguais e que tudo aquilo que as reivindicações feministas pleiteiam são invenções, devaneios ou inconformismos sem propósito. Afinal, o que mais poderiam querer as mulheres? Proponho-me a escrever uma contribuição parcial para responder a esta questão.A expressão movimento feminista implica um sentido de trânsito, de alteração, de algo que não é estático. Isso significa que as lutas estão em constante transformação e que mesmo as nossas conquistas não podem ser dadas como garantidas.Em um momento da história, foi importante que as mulheres tivessem seu direito ao reconhecimento político e civil assegurado, como o direito ao voto, acesso à educação formal, o direito ao trabalho, dentre outros. Formalmente, essas garantias foram obtidas ao longo do século XX, porém, um olhar mais cauteloso percebe que mesmo esses direitos não foram, de fato, alcançados. Digo isso porque ainda persiste a desigualdade material entre homens e mulheres no campo civil e político, como demonstrarei com alguns exemplos.Embora tenha havido uma mudança nesse cenário, as mulheres ainda têm uma menor representação nos espaços formais da política, em que pese sejam a maior parte do eleitorado brasileiro (TSE, 2022). Por exemplo, nas últimas eleições para deputado federal, apenas 17,7% dos eleitos são do gênero feminino (TSE, 2022).Se fizermos um recorte mais específico, percebe-se que a maior parte das eleitas é branca, de classe média e que possui familiares na política. Isto é, não estamos diante, nem mesmo, de uma paridade de gênero e, concomitantemente, devemos permanecer lutando para que mais mulheres negras, indígenas e pardas tenham uma representação mais expressiva.Vamos para mais um exemplo: o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo (TGEU, 2021). Segundo o relatório de 2021 da Transgender Europe, 94% desses casos foram transfeminicídios, ou seja, a maior parte contra mulheres trans e travestis (TGEU, 2021). Não há direito mais elementar do que o direito à existência, o que significa ter o aparato do Estado disponível para protegê-lo enquanto sujeito de direitos. Os dados alarmantes contra as mulheres trans mostram que o seu direito humano mais básico, o do reconhecimento, não foi garantido.Diante desses dois exemplos, que poderiam ser múltiplos, espero ter mostrado que sim, infelizmente, ainda há muito o que lutar. Como professora de Direito, tento ensinar para os meus alunos que, por mais que haja uma importância histórica de conquistar formalmente os direitos subjetivos, a luta não acaba no momento em que são escritos em um papel. O verdadeiro desafio vem depois, no momento de efetivá-los.Texto da professora Anna Laura Maneschy Fadel, professora do curso de Direito e pesquisadora da formação do sujeito mulher na filosofia e no Direito, publicado na edição #68 da nossa newsletter, a Impulso. Você pode assinar a newsletter gratuitamente, nesse link.13 de março de 2023